segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Poema-de-quatro-quadras



Há trevos azedos
Que dão flores lindas
Impossível não amar elas
Da minha janela

Há trevos especiais
Como este daqui
De quatro folhas
Escondido entre os de três

Estou tão feliz agora!
Dizem que trás sorte
Mas não me atrevo a
Tirar este trevo do jardim

Tive tanta sorte em
Encontrá-lo que
Não quero ver
Minha sorte secar

domingo, 30 de dezembro de 2012

Moda



Minha tatuagem discreta
Não me faz diferente
Minhas orelhas intactas
Não me fazem diferente
Meu cabelo virgem
Que só conhece água
Shampoo; o mesmo corte
E penteado despenteado
Não me faz diferente
Meus panos baratos
E meus sapatos furados
Não me fazem diferente

As listras de cada zebra
Fazem-nas diferentes entre si
As pintas da minha amiga onça
Faz dela única entre outras onças
Minhas digitais são únicas
Mas, não faz de mim diferente...
Fariam de mim diferente
Como é entre as zebras e onças
Se eu não pudesse pensar
Inventar, escrever e assinar

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Cacos de vidro

Eu sempre quis escrever um poema profundo
Tentarei agora que estou sentado aqui, no fundo do poço
Lugar de onde tenho a minha complexa visão de mundo

Pela milésima vez este ano pensei em suicídio
Mas, lembro bem, como disse o grande filosofo não sei quem
“A ideia do suicídio é uma grande consolação:
ajuda a suportar muitas noites más.”
Esta é uma noite má, porque quiseram fazer dela assim
e eu acatei depois do esperneio

Mas, não tenha medo, não se preocupem com o meu juízo
Eu não teria coragem de tirar a vida de uma ratazana
Como poderia tentar contra a minha, que vale um pouco mais?
Eu não tenho desespero nem coragem suficiente para isto
E se tivesse coragem, incompetente que sou,
acho que sobreviveria à tentativa...

O que eu queria mesmo era que Deus criasse outra maneira de me levar a ele
Em vez de ficar enviando bobagem à minha cabeça
Tantas crianças são fulminadas por meningite
ou outras doenças, sem ter tido tempo de sentir o vento no rosto
Sem ter tido motivos de chorar ou de sorrir
Sem ter tido tempo de pensar coisas boas e ruins
Mas eu tenho saúde de ferro até o momento presente e
disso também eu não posso reclamar

Mas tem um lado bom em estar vivo
Vivo eu posso imaginar...
Morto eu não poderia ver a cara sem graça dos meus desafetos
Reunidos, dizendo que eu era um bom menino;
Não poderia ver ninguém dizendo entre soluços que
apesar de tudo gostava muito de mim;
Que eu era um menino talentoso e que tinha um grande futuro...
Leriam meus poemas, compartilhariam alguns deles, até os ruins
Mas eu não sou bobo, ainda tenho muitas coisas pra fazer antes de morrer
Tenho muitas coisas para escrever e dizer...
Quero viver até os 105 anos de idade e imaginar todas estas cenas
com um sorriso disfarçado no rosto
Ainda tenho muitas coisas para aprender...

É deplorável não morrer inteligente
E tantas pessoas morrem assim, sem ser doutor em nada
Como se lembrariam de mim se eu morresse hoje?
O que morreu e não deixou uma família; filhos para criar
Herdeiros das misérias do mundo
O que morreu e não deixou uma casa com escritura em seu nome
O que morreu e não deixou um carro na garagem; conta no banco
O que morreu e não deixou um diploma na parede; na gaveta
O que morreu sem nunca ter saído do estado em que nasceu
Seria muito triste. Triste não!
Seria horrível morrer e não deixar nada além da honestidade e pensamentos!
Cacos de vidro

Depois de ler e reler e reler os poemas que tanto gosto, de Fernando Pessoa:
Poema em linha reta; Lisbon Revisited; Tabacaria
Apontamento; Autopsicografia; Isto e Liberdade
Em especial os de Álvaro de Campos
Sinto uma grande euforia
Um misto de alegria e tristeza
Alegria por saber que há muitos anos atrás alguém importante
foi acometido também pelos mesmos sentimentos que me tomam
E foi muito claro, lúcido e preciso em seu poemas
Em contrapartida, fico triste, pois vejo que tudo o que eu gostaria de escrever  
já foi escrito e assinado
E não deixaram nada de novo que eu pudesse escrever sobre os meus sentimentos
Na verdade, é bem pior que isso...
Já que tanta clareza, lucidez, precisão e prestigio não dizem nada a ninguém
Não passa de palavras bonitinhas que nada tem a ver com suas vidas e realidades
Como posso esperar, eu, com meus poemas fuleiros
passar alguma coisa que faça sentido?

Gostaria neste momento de poder xingar todos de hipócritas, falso moralistas,
materialistas, egoístas, e todos os itas e istas ofensivos que eu encontrasse
Para que me xingassem também, destes e de outros xingamentos
Quem sabe, com muita raiva de mim, poderiam assumir de vez
o que teimam em disfarçar e começassem a me ignorar de verdade?

Não pergunte por que estou triste, sorriso é como um bocejo, um espirro
Quer ver um sorriso em meu rosto, não me peça para sorrir
Pode começar compartilhando um dos meus poemas
em vez de ficar dizendo que tem amizade por mim
Não me chamem de amigo
Amigão é o caralho!
Se meus versos fossem tão ridículo quanto um sul-coreano saltando
como uma perereca no asfalto quente, até minha ex-namora o compartilharia
Se meus versos fossem afinados e servissem para nossa alegria
até um professor o compartilharia
Se meus verso falassem de doação de sangue em vez de doação da alma
Se falassem de câncer de mama em vez de câncer da alma
Se falassem da cor da pele em vez da cor da alma
Se falassem da preservação da natureza em vez da preservação da própria alma
Talvez meus amigos o compartilhassem
Amigos assim eu não quero!
Dispenso
Amigos que só se achegam na hora da piada
Será que a imagem de um cachorrinho fofinho com freses clichê entre aspas
vale mais que os “sentimentos em versos” de quem se tem como amigo?
Eu não sou tão ruim, meus poemas também não são tão ruins
Só não foram feitos, necessariamente, para agradar ninguém
Verdades ou mentiras, o que querem de mim?

Qualquer tolo, ignorante, fazendo papel de ridículo no programa “ídolos”
é bem melhor que eu
“o importante é que está tentando...” palavras de: quem é sabe
Prefiro ridicularizar-me com meus versos...
Eu, que não sou estudioso, mas pelo menos sou estudante
Eu, que não tenho trabalho fixo agora, mas sou trabalhador desde os quinze
Que sei pegar uma vassoura e varrer um chão direito
Eu, que nunca estudei em boas escolas, não sou tão inteligente, mas tento parecer ser
Ainda assim, volta e meia, ouso lição de moral
Nunca é o suficiente, nunca irei agradar!
Até esfregar alguns bens materiais de valor na cara de alguém

Sempre trabalhei porque sou trabalhador
Trabalho até de graça, às vezes
Mas eu não nasci para isso – trabalhos braçais ou repetitivos
Não nasci para acordar cedo, olhar para o relógio e
sair correndo para abrir a loja
Não nasci para ensinar nada a ninguém
Não nasci para ministrar palestras, nem viajar a negócio
Eu não nasci para fabricar rodas, nem para ser dono de uma loja de rodas
Eu não sou uma máquina, tampouco uma peça de uma máquina
Eu nasci para inventar a roda, mas a roda já foi pensada e inventada, é claro!
Então eu preciso pensar outra coisa... e isso pode durar uma vida inteira
Quando eu conseguir, se eu conseguir, os “homens práticos” irão saber o que fazer com a descoberta, irão palestrar, ensinar a outros, fabricar, reproduzir, desenvolver,
negociar, comercializar e ganhar dinheiro - que é o mais importante
Muitos gênios, artista, pensadores, filósofos,
poetas, palhaços, levam uma vida inteira simples e no anonimato
Às vezes são até humilhados e menosprezados
e só são reconhecidos duzentos anos depois...
Não quero viver cem anos pra ser esquecido em dois
Preferia viver intensamente trinta anos, e ser lembrado sempre por isso
Estar à margem da sociedade? Talvez
Estar à margem de mim mesmo e dos meus ideais? Nunca mais

Para ganhar algum dinheiro só preciso fazer o que sempre fiz. Trabalhar duro
Para ganhar muito dinheiro eu não tenho que estudar
Tenho que aprender a driblar...
com a bola, não com as palavras
Se eu escrevesse letras tediosas dizendo que eu sou o cara
Que quero tchu e tcha e que se eu te pego ai ai
Eu teria alguma chance de acertar, e quem sabe um dia chegar lá
Esfregar bens materiais na cara de alguém
Mas para mim arte não se resume ao que consideramos bonitinho
Musica não se resume ao estilo que gostamos
E poema não é só o que fala de amor rimando-o com flor
Meu pai é eletricista e minha mãe
empregada domestica, não empreguete!
Não posso esperar que meus versos excêntricos
como uma metralhadora cheia de magoas encontre algum valor
Então, para a proteção de uma dúzia de pessoas que prezo
Aviso de antemão: deitem-se no chão

“Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente,
mas o que melhor se adapta às mudanças”
Lendo esta frase de não sei quem, veio logo uma cena a mente
Um mendigo passando bem em uma mansão
E um milionário adoecendo em um barraco de madeira
(Isso é só uma ilustração, não levem ou pé da letra!)

Eu não uso creme de cabelo caro
Eu não uso creme de cabelo!
Não quero meu cabelo mais liso nem mais crespo do que é
Lavo-o diariamente, quando esqueço não lavo ou lavo duas vezes
O shampoo que uso vem em embalagem de 400 ml e custa 14 reais
Dura aproximadamente dois meses, porque não economizo
Sei sobreviver com pouco ou quase nada
Eu não preciso de muito dinheiro, graças a Deus!
Luxo para mim é lucro, não é essencial

Você não imagina o que é uma mulher sem absorvente para usar
naqueles dias que a menstruação desce
Você não imagina o que é notar a falta de papel higiênico em casa
no momento que a merda mergulha no vaso
Você não imagina o que é assistir um filme no Cine Lapa
e se divertir sem reclamar de uma coisa que seja
Você não imagina o que é não ter a visão
e ter que viver assim mesmo, como se a tivesse
Você não imagina, mas vive-se com pouco direi e sem a visão
Eu tenho ambos, pouco dinheiro e visão
Às vezes vejo até demais

Não quero piedade; não quero ajuda; não quero apoio
Não quero conselho; não quero dica; não quero nada!
Não sou legal como são meus amigos
Não quero ser inteligente como são meus amigos
Não quero ser esforçado como são meus amigos
Não quero ser trabalhador como são meus amigos
Não quero ser equilibrado como são meus amigos
Eu queria reconhecimento não pelo que digo que sou, mas pelo que vêem
Eu queria incentivo...
Como disse, eu queria...

Se eu tivesse vergonha na cara não jogaria perolas no chiqueiro
O que aconteceu com o poeme-se o mundo?
Pois, se Jeffer-se o mundo não lhe serve
Foda-se...